quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Convidado Pedro J. Bondaczuk

Como escapar do abismo

.

A vida nos impõe, em algum momento da nossa trajetória – que, a rigor, nunca sabemos qual será – circunstâncias dramáticas, não raro dolorosas, tão marcantes que chegam a decidir o rumo que iremos tomar dali por diante.

São as tais das “crises”. Temo-las, amiúde, de todos tamanhos e consequências, dependendo de como lidamos com elas. Algumas, quando se dissipam, tornam-nos mais maduros, conscientes e sábios. Conferem-nos a experiência necessária para escaparmos de outras armadilhas semelhantes, caso voltem a ocorrer. Outras... deixam-nos marcas profundas, feridas abertas ou, no mínimo, cicatrizes.

Mas sempre ocorre a crise das crises, a maior de nossas vidas, a tal decisiva, em que sentimos que se dermos um passo adiante, um único e reles passo, despencaremos no abismo e nos destruiremos. Nesses casos, como agir? Buscar ajuda? De que tipo? De quem? Até que ponto conseguiremos nos livrar dessa situação auxiliados por alguém?

Nosso instinto de preservação nos compele a fugir. Mas, para onde? Da tal da crise das crises não há fuga. Um passo precipitado, um único e reles passo, determinará nossa queda no abismo e a conseqüente destruição. O que fazer? Sentar na beira do caminho e esperar ajuda? Aguardar até que alguém nos resgate? E se ninguém nos encontrar? Qual a solução? O que fazer?

Pareço estar sendo melodramático, mas não estou. Quem já viveu um pouco mais e passou por essa experiência, sabe do que estou falando. O escritor italiano, Cesare Pavese, nos dá uma indicação de como agir: “O único modo de escapar ao abismo é observá-lo, e medi-lo, e sondá-lo e descer para dentro dele”.

Como se vê, recomendação, no mínimo, sensata. “Descer” ao fundo do abismo não é o mesmo que “cair” nele. Implica em ação consciente, pensada, medida, planejada e executada com perícia. Se chegarmos ao fundo do precipício por esse meio, dificilmente deixaremos de sair dele. Como? Da mesma forma que chegamos ao fundo. É diferente, pois, da queda, que implica em morte.

Perguntam-me, amiúde, o que acho dos tais livros de auto-ajuda, que vendem cada vez mais e fazem de seus autores gurus da modernidade. Se os encararmos como o que de fato são – e que sua própria designação já sugere – acho-os úteis, válidos e até chego a recomendá-los.

Todavia, se virmos neles solução para “todos” nossos problemas (ou sequer como “solução”), provavelmente não desceremos ao “fundo do abismo” da tal da crise das crises, por nossos próprios meios. Despencaremos no precipício

Explico. Como chamamos a esse tipo de literatura? Chamamo-la de “solucionadora de problemas”? Ou de “infalível magia para vencer na vida”? Ou de manuais para superação de “todas” as crises? Não, não, não!

Dizemos que são livros de “auto-ajuda”. Ou seja, que “podem” nos ajudar (ou não) a resolver o impasse que nos ameaça e angustia. Mas jamais solucionam sozinhos. Não há fórmulas mágicas e prontas para isso (antes houvesse). A decisão final é, e sempre será, nossa, absoluta e exclusivamente nossa e de mais ninguém.

Encarados, portanto, de maneira correta, os livros de auto-ajuda tendem a ser úteis. Pelo menos nenhum deles traz mensagens negativas, agressivas, destrutivas, suicidas e loucas. Se não tiverem sugestões válidas e funcionais para os problemas que estivermos encarando, certamente não recomendarão que venhamos a avançar cegamente em direção ao abismo, sugerindo, por exemplo, que viremos a voar por sobre ele, mesmo que não tenhamos asas.

Aconselhar os outros, sem assumir a responsabilidade pelas conseqüências dos conselhos caso estes sejam seguidos, todavia, é cômodo e fácil. Cada qual, porém, sabe de si. Conhece os próprios limites e sabe até que ponto pode ir em frente.

Vejam o caso de Cesare Pavese, por exemplo. É certo que não se tratava, rigorosamente, de um escritor de auto-ajuda. Deixou, porém, vários textos (como o que citei acima), que podem ser interpretados como tal. Se nos limitarmos a lê-las, como meros temas de reflexão, nos parecem observações bastante lúcidas, inteligentes e sensatas.

Todavia, quando se viu confrontado pela crise das crises da sua vida, o notável escritor italiano não seguiu as recomendações que deu aos outros. Não observou o abismo. Por conseqüência, não o mediu, não sondou e nem desceu dentro dele. Caiu, desastrosamente, de ponta cabeça no vazio. Sabem como Cesare Pavese morreu? Suicidou-se!



---

Pedro J. Bondaczuk



Nenhum comentário: