domingo, 17 de janeiro de 2010

O Capibaribe e Sua Guerra

Na noite de hoje, eu estava atravessando a ponte e, subitamente, decidi parar. Acabara de escurecer e era hora dos trabalhadores fatigados retornarem ao lar. Mas era uma noite incomum, dessas que não tem no Recife facilmente. Não havia sinal de engarrafamento numa das principais vias da cidade, nem buzinas e motores soprando suas melodias. Por isso decidir parar e observar como estava a noite para o Rio Capibaribe, se ele também compartilhava do breve regozijo de uma cidade em paz.

Suas águas carregavam um grande Mapa Mundi de nuvens, como que disposto em uma extensa mesa flutuante. Distinguiam-se os continentes cinzentos em sua imensidão, separados por oceanos negros. Enquanto eu fantasiava sobre qual seria a minha pátria querida, vi surgindo embaixo da ponte uma água podre, de tom mais claro, porém pestilento. Depois eu entendi que era como um estandarte, representando o silencioso contingente de lixo que avançava. Não tardou para invadir os continentes anuviados até dominá-los por completo. Um a um, estes foram caindo diante de sua força interminável, pois quando parecia que havia terminado um ataque, logo em seguida vinha um ainda mais forte e fulminante. Era uma guerra silenciosa, mas feroz. E o Capibaribe agonizava. Numa atitude desesperada, deu as ordens às suas águas e tentou recuar, mas a mesma correnteza que o recuou foi a que fez avançar ainda mais o exército em sua perseguição. O campo de batalha foi deixado desconfigurado. Os continentes sem a mínima força ou esperança de reagir.

O mais curioso é que neste exato momento olhei para o céu e o Mapa Mundi de nuvens estava intacto, numa tranqüilidade digna somente dos deuses. Assim o Capibaribe foi sentenciado a travar, sozinho, sua guerra contra os dejetos humanos.

André Espínola

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