domingo, 1 de fevereiro de 2009

Sobre prazer, medo e motoqueiros



- por que esta máquina no meio das minhas pernas me dá tanto prazer?
Não falava do meu pênis, foi meu pensamento numa manhã, enquanto acelerava minha moto pela avenida W3. Rodei por dias sempre com essa pergunta na cabeça. Queria escrever a poesia definitiva sobre motociclismo. Relacionei vários sentimentos, porém nenhum transmitiu nem de leve a delícia que é pilotar uma motoca. O que mais se aproximou foi, curiosamente, o medo.
O medo de cavalgar um motor de 450 cilindradas e 180 quilos sobre duas rodas aumenta com a velocidade. Quando acelero a 100km/h entre os carros ou quando travo as rodas antes de curvas traiçoeiras, imediatamente penso em acidente, ossos quebrados, carne dilacerada e, talvez, morte. A adrenalina vai à estratosfera, sinto um calafrio subir pela coluna me lembrando que estou vivo,então aperto os dentes e termino a manobra, satisfeito, pois sou capaz de superar o pavor. Não é para todos.
Adoro este perigo no dia-a-dia, faz o sangue rodar mais rápido nas veias, é uma aventura em que sou o personagem principal. Com o risco de andar de moto, não sou apenas um pacato cidadão que tem uma vida tediosa, quando estou pilotando o meu corcel de aço, sou um cavaleiro indomável e errante. Bastante errante, diga-se. Quase um vilão*. Mas só na aparência, pois continuo a ser o bundão de sempre.
Esse risco, claro, é controlado. Sigo fielmente as regras de segurança mesmo quando a moto instiga o espírito a se superar, a fazer coisas que são vistas com reserva pelos chamados motociclistas, aqueles que conseguem seguir todas as normas.
Sou um motoqueiro, embora não me veja como um desordeiro. Um leve outsider, talvez, pois também descumpro outras regras sociais imbecis (que não vêm ao caso). No trânsito, nunca faço as besteiras dos motoboys, trabalhadores que usam a moto como equipamento de serviço, pessoas que não sentem tesão pela motocicleta.
Eu sinto tesão. E medo. Juntos, o tempo todo. Esta antítese cria o tal sentimento que explica a delícia que é andar de moto. Também me preserva a integridade, impedindo que me arrisque em besteiras, e me salva do tédio, me tirando do seguro e chato sofá da sala. Talvez eu deva criar um novo termo. É uma mistura de liberdade com mistério, de potência com limite, de amor com temor, parecido com a fé em algum deus.
É isso. Por que a motocicleta me dá tanto prazer? Pois eu tenho fé que o prazer será sempre maior que o medo!
Ser um motoqueiro, assim, acaba sendo uma metáfora para a vida: enquanto eu não temer me arriscar, e errar, em busca da satisfação, continuarei acelerando pela estrada da vida cheio de tesão!
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* vilão era o nobres sem título, que perambulavam pelos feudos atrás de pilhagens, conquistas e aventuras.
* outsider = fora de enquadramento

2 comentários:

Deveras disse...

Ficou bem legal a analogia entre o motociclismo e a vida. Agora, olhando aquela foto do "Motoqueiro Fantasma" lembrei que tinha ficado chateado com o roteiro e com a escolha do Cage para o papel título. Mataram o motoqueiro... rs

ficanapaz

Blog Bar do Escritor disse...

foi bom saber do sentimento de um motoqueiro, dá pra entender melhor certas atitudes...eu odeio moto!mas gostei do texto, humaniza o motoqueiro.